Saí de casa às 4h00 e ainda estava escuro.
Não sei de estações do ano, ou se ainda é primavera…
Peguei o carro do patrão e saí, sem nada no estômago. Sabia que aquele seria meu último dia no emprego de chofer de táxi…
Entrei no tráfego alienígena no qual você também estava.
Vi que você me observou, meu rosto não é de agradar ninguém mesmo, tal é a ausência de tanta coisa em minha vida.
Não sei bem das peripécias que faço lá fora no trânsito, mas já não deveria mesmo estar dirigindo, porque meu mundo interior vai mal.
Recortei o seu anúncio no jornal, e resolvi procurar emprego, em vez de trabalhar.
Estive confuso, cansado de promessas, sem saber o que iria fazer para sustentar a família.
Sei da força que fiz para aparentar calma na nossa entrevista, quando uma angústia me sufocava.
Não entendi o seu olhar de espanto, porque não relacionei com alguém que eu acabara de encontrar no tráfego lá fora.
Conversamos durante quase uma hora, e agradeci a você, mentalmente, por me ouvir. Senti você me inquirindo com o olhar, buscando em mim quem sabe, o quê? Contradições? Mentiras? Verdades?
Você marcou então a data dos testes e uma lufada de esperanças me envolveu.
Gostei muito quando você me acompanhou até a porta, senti-me gente, seguro, confiante.
A sua forma de me tratar foi, naquele momento, tão importante quanto o meu emprego.
Hoje, entendo o porquê do seu olhar inquiridor.
Você não sabia da minha agressividade no trânsito e o porquê do meu autocontrole na entrevista.
Não sei se passarei nos seus testes, se terei condições, se você tem vaga para mim.
O mínimo que posso lhe pedir, nem é a chance de me empregar, que essa, muitas vezes, nem depende só de você.
Eu lhe peço apenas que me entenda, que sorria para mim, que converse comigo, que me dê um pouco do seu tempo tão cheio de afazeres, pra que eu consiga ainda ter um pouco de esperança.
Cansei de bater de porta em porta, e ser mal recebido, e luto para não me tornar um marginal, mas, de você, que tem estudo, que tem altura, que tem tanta coisa, eu espero simplesmente ser tratado como gente…
Autor Desconhecido